E com a palavra: o professor!

    Os textos a seguir, de autoria da professora Maria Cleide, foram produzidos para atender a um objetivo didático: fazer com que o aluno escreva com naturalidade, partindo da própria vivência e, claro, observando a experiência do outro, seja ele um escritor consagrado ou um professor que gosta de escrever.


     Quem já não se sentiu inferior ao ser comparado com outra pessoa? Somos mestres em comparar, colocando o outro para baixo ou para cima, conforme o nosso interesse. "Seu irmão é melhor que você", diz o pai. "Sua irmã mais nova está mais adiantada", reforça a mãe. "Você é o mais desinteressado", completa o professor. E assim, de "elogio" em "elogio", lá vamos nós cavando um abismo, enterrando nossa autoestima.

    Essa palavra tão poderosa, capaz de nos derrotar tantas vezes, mas também de edificar, é o adjetivo. No dicionário, Aurélio o define como "a palavra que caracteriza os seres ou objetos, indicando-lhes uma qualidade, caráter, mode de ser ou estado". E nós a empregamos sem piedade: "Ele é um tipo de cafajeste". "Ela é uma garota assanhada, periguete".

    Tanto piores ou mais cruéis são os adjetivos que viram apelidos, que apontam nossas características de modo pejorativo: "Lá vem aquela baixinha!", "Olha só aquela branquela!", "Qual é, Negão!", "E aí, narigudo?!"

    E se aquele que amamos não nos corresponde porque a nossa "concorrente" é mais magra, mais bonita, mais atraente, a mais-mais,  mundo desaba sobre nós, pobres mortais, cujo maior desejo é ser desejado pelo outro.

    Fazer uso do adjetivo de forma positiva, eis o segredo da boa convivência. A melhor maneira de estreitar os laços de amizade e amor é reconhecer no outro o que ele tem de melhor.

 

Um dia inesquecível

     Heroína, minha professora primária, era mesmo uma Heroína (com H maiúsculo!). Como é que aguentava aquela turma tão endiabrada? Como é que me aguentava, principalmente?

     Lembro-me tão bem dela! Era magrinha, magrinha demais. Tão franzina que as sua costelas ficavam à mostra. Mas, em compensação, tinha muitas qualidades que reconhecíamos.

     Não sei se ela dava aula direito, porque eu não prestava mesmo atenção. Sei, porém, que era muito querida, pois sempre que retornávamos à sala de aula após o recreio (era assim que chamávamos o intervalo) meus colegas enchiam um saquinho de balas Softs e davam a ela. Também não faltava uma flor, num copo sobre a sua mesa e que, no final da aula, ela colocava no cabelo.

     Não compensava dar aula por tão pouco, penso eu agora, mas Heroína tinha essa missão e quase nunca lhe faltava paciência, exceto comigo; afinal, paciência tem limite, e eu ultrapassava este limite. Como conversava além da conta e andava demais dentro da sala, de uma carteira para outra, terrivelmente inquieta, nem assistindo à aula, nem deixando os outros assistirem, um dia ela pediu que eu me retirasse. Foi uma senhora vergonha!

     - Chega! Pegue o seu material e saia.

     Nervosa, arrependida, implorei mais uma chance. Fiz cara de choro.

     - Eu vou ficar quieta...

(Os colegas assistiam àquela cena, engolindo o riso, mas sentido o gosto de me ver no embaraço.)

     De nada adiantou a minha súplica. Deixei a classe sem cara e sem coragem. Também não me animei em ir para casa. Como explicar que fui expulsa por indisciplina? Fiquei escondida no pátio, entre as árvores, até que a aula acabou e eu pude, enfim, misturar-me com os colegas e deixar a escola como se nada tivesse acontecido. Embora tendo que suportar os comentários debochados dos colegas que se divertiram muito às minhas custas.



Sonho Revelador

Essanoite sonhei que não havia mais matemática. Acordei e... Que alívio! Como poderei viver sem contar o meu dinheiro, sem pagar as minhas contas, sem contar os meus lucros, sem calcular – para evitar – meus prejuízos? Oh matemática, sei bem das minhas limitações na nossa relação, mas, definitivamente, eu não vivo sem ti!

     Dizem que “dinheiro não traz felicidade”. E a matemática? Como conseguir alcançar a tal felicidade sem contar? Contar o tempo, contar as conquistas, contar os amigos (somar), contar os inimigos (diminuir), contar, contar, contar... até  perder a conta de quanta temos que fazer para viver, graças a ti!                 

 

O que é um dia perfeito?

     Dia perfeito é aquele em que marcamos o primeiro encontro com o namorado. Amanhece tudo azul, nós acordamos naquele estado de graça e com o coração cheio de esperança. E como é dura a espera! O relógio trabalha sem pressa, as horas não passam, os minutos pingam, o tempo faz pirraça. E nós naquela ansiedade! Preparar-nos para o tão almejado encontro é uma luta. Nenhuma roupa parece ser ideal. É tanta troca! Vestimos uma, vestimos outra...(“Será que esta tá legal?” “Será que ele vai gostar?”) que até o espelho se cansa da nossa beleza. Enfim, o relógio inimigo resolve ceder e dá a hora exata. E lá vamos nós radiantes! Ele, é claro, já se encontra naquele lugar à espera, com a mesma ansiedade. Que dia perfeito!


Razões do coração

     Duas vidas sofridas e um destino: a união pelo amor. Assim começou a história de João e Marina. Ele era filho de pai alcoólatra e mãe devota, que vivia implorando a Deus para o marido parar de beber, motivo de conflito constante na família. Ela não conheceu seus pais, foi criada pela avó, mas não parecia tão desprotegida. Cedo sofreu. Cedo aprendeu com o sofrimento. Conheceram-se. Amaram-se. Casaram-se.

     Maria Alice nasceu poucos meses depois. Tudo perfeito ou quase. Afinal, felicidade completa só no último capítulo da novela. Mas a vida tortuosa de antes cedeu lugar à tranquilidade de um lar aconchegante.

     O tempo passou e, como tudo passa, tudo muda. O sentimento mudou. O amor adormeceu. Sono profundo. Quase estado de coma, gerado pela rotina. Começaram, então, as brigas. Ela, entediada com a vida doméstica sem perspectiva: tinha pouca instrução e muita ambição. Ele, embora trabalhasse “feito um condenado”, conforme costumava dizer, não conseguia melhorar as condições financeiras da família. E “o amor resultou inútil”, como disse Drummond num célebre poema.

     Separam-se. Rancorosos, mas decididos. Era o único caminho. E Marina, cheia de sonhos, foi tentar a vida nos Estados Unidos, onde uma irmã de criação se dera bemcasando-se com um americano rico. João ficou com a filha, o verdadeiro e eterno fruto daquele que foi um verdadeiro, porém finito amor. “O coração tem razões que a própria razão desconhece.”



Poema feito especialmente para a Semana de Educação para a Vida

 

TESOURO DISPUTADO

Nova Jaguaribara,

Interior do Ceará.

Cadê a água

Que passava por lá?

 

Irriga as grandes plantações

Provoca enormes confusões.

Seguranças armados

População sedenta

- Bem sei já não aguenta

Tamanha discriminação.

 

Canal da Integração

Des-integração

Seu Taxinha que o diga

Enfrentou até a polícia

E ameaças de prisão

 

A água, antes um bem natural,

Agora é ouro ou petróleo,

Produto de grande valor

E uso tão desigual!

 

Como impedir a guerra pela água

Para evitar

    esse confronto militar?

- Pobres irmãos cearenses!

 

                        

 

Irrigando os corações

Despoluindo as consciências

Para fazer jorrar

Aágua-petróleo-ouro

Na sede do Ceará!